sábado, 14 de junho de 2014

Artigo de Roberto Rocha: "O nome da Rose"



Sobre homenagem a pessoas vivas em obras públicas

2 de agosto de 2009

Como no Maranhão todo absurdo tem precedentes, aqui, mais que obras, nomearam-se instituições, contrariando a Constituição Federal que proíbe, por via de seu artigo 37, a homenagem a pessoas vivas em obras públicas. Não apenas pontes, viadutos, escolas, prédios de cimento e cal, mas instituições que carregam em si todo o simbolismo da representação da cidadania, toda a irradiação política e moral que excede a sua contingência física.

O caso mais gritante, o mais chocante sem dúvida é o da homenagem à governadora Roseana que lhe foi prestada por longos anos pelo Tribunal de Contas do Estado. E não se diga ter sido sem o consentimento ou mesmo o incentivo da homenageada. Basta lembrar que a maioria governista da Assembléia Legislativa abonou o absurdo, via mudança constitucional, corroborando a agressão ao povo maranhense.

Por isso, já em 2004, reforçando as ações protocoladas na Justiça por cidadãos indignados, apelei de público à senadora em artigo reproduzido em jornais, para que ela renunciasse a essa intrigante homenagem nos poupando “do constrangimento que aquela fachada nos impõe”.

Percebia desde então que a homenagem não era propícia nem mesmo à homenageada, uma vez que desfigurava as nossas instituições, destruindo a sua credibilidade e conceito. E alertava que o gesto do Tribunal de Contas correspondia a fixar posição política, achincalhando a democracia, agredindo e prejudicando outras agremiações partidárias que assim se tornavam seus eventuais reféns.

Da senadora recebi apenas o silêncio acumpliciado pelo desdém do presidente do Tribunal, que não via nada demais na homenagem. Curiosamente, na semana passada, colhida pelo furacão de denúncias que exibem, como uma fratura exposta, os desmandos do grupo oligárquico, foi a própria governadora quem solicitou a retirada da homenagem.

Teria sido um surto inesperado de bom senso? Um esgar de humildade? Não, foi apenas a antecipação de uma decisão do nosso Tribunal de Justiça que, ainda que tardiamente, resolvera fazer valer a lei maior. E o escárnio ainda prosseguiu pela explicação do ex-presidente do Tribunal de que o gesto era para “evitar toda essa celeuma”.

Incrível. Não foi pela moralidade, não foi pela decência, não foi pela obediência à carta magna. Foi apenas para evitar essa celeuma, essa discussão enfadonha e inútil. Desde 2002 essa “celeuma” se arrasta, mas só agora, ao ameaçar engrossar o caldo das denúncias que tomaram conta do noticiário nacional, passa a ter algum valor e consideração moral. Nenhum mea culpa, nenhuma penitência, nenhum gesto de grandeza se viu até aqui nesse episódio.

Não pude deixar de lembrar da expressão latina Stat rosa pristina nomine, que Humberto Eco utilizou no desfecho do seu consagrado romance O nome da rosa. Significa “a rosa antiga permanece apenas no nome”, ou seja, de que a vaidade é vã, convocando o leitor para a aceitação humilde da efemeridade da vida. Aqui no Maranhão o nome da Rose não convoca para a contrição e o desprendimento, antes reitera a vaidade e o escárnio dos poderosos.


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